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O Maranhão é a nova fronteira portuária, ferroviária e espacial do Brasil

 

Professor Allan Kardec Dualibe Barros Filho, ex-pró-reitor de Pesquisa da Universidade Federal do Maranhão

O professor Allan Kardec Duailibe Barros Filho, ex-pró-reitor de Pesquisa da Universidade Federal do Maranhão, está convencido de que “o Maranhão é a nova fronteira econômica do Brasil”. Ele aponta diversas obras e investimentos que colocam o Estado na rota do desenvolvimento global, com a implementação do Centro Espacial de Alcântara e com a construção de mais dois novos portos: o Terminal Portuário da GPM e o novo Porto de São Luís, projetado pela Cosan.

Graduado em Engenharia Elétrica pela UFMA, e com mestrado e doutorado pela Universidade de Nagoya (Japão), Allan Kardec é pós-doutorado pelo Riken (The Institute of Physics and Chemistry). Ele orientou mais de 50 alunos em nível de mestrado e doutorado e tem mais de 300 artigos publicados em revistas e conferências internacionais.

Além de pró-reitor de Pesquisa da UFMA, Allan Kardec já ocupou o cargo de diretor da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Ele analisa com otimismo a construção, também, de uma ferrovia que cruzará o Maranhão de Açailândia a Alcântara, com extensão de mais de 500 km.

Nesta entrevista, Allan Kardec faz uma dissertação sobre o este novo cenário, do qual o Maranhão desponta como uma terra de oportunidades:

Jornal Pequeno – Por que o senhor considera o Maranhão como a nova fronteira econômica do Brasil?

Allan Kardec – A pandemia evidenciou o que já vínhamos falando há algum tempo: a quarta revolução industrial está em curso e uma nova estrutura planetária emerge a partir disso. Em particular, o Maranhão aparece como ponto de convergência do que chamamos de “Arco Norte” do Brasil, ou seja, todo o território ao norte de Brasília.

Uma breve análise nos permite verificar que para aqui convergem pelo menos duas ferrovias: Estrada de Ferro Carajás e Ferrovia Norte Sul. Esta última conectando o Maranhão a São Paulo, os portos do Itaqui ao Porto de Santos. Aqui também temos o Centro Espacial de Alcântara, onde empresas já se preparam para trabalhar. Igualmente, está em debate nacional a produção de petróleo na Margem Equatorial brasileira, onde a Petrobras anunciou para os próximos anos um investimento de mais de R$ 8 bilhões.

Igualmente, a Emap está com planejamento de investir fortemente naquilo que chamamos de “transição energética” onde novos combustíveis como a produção de hidrogênio verde será usada para a produção de fertilizantes – algo em falta no planeta hoje.

Tenho opinião consolidada – junto com outros amigos do grupo “Pensar o Maranhão” criado pela Fiema – de que o Maranhão se tornará um grande “hub” de logística do Brasil, com tendência portanto a ter um papel central no movimento de grãos, combustíveis e outros tipos de cargas para o resto do mundo, principalmente os grandes consumidores do planeta, que se concentram no hemisfério norte. Ou seja, por um lado, o Maranhão será um centro para onde convergem as cargas por duas grandes ferrovias aos seus portos, ser um polo produtor de energia, além de ser um “hub” espacial.

JP – Qual de fato é hoje a realidade e quais as perspectivas do Maranhão na área portuária?

AK – A realidade é extraordinária, mas tenho a impressão de que há uma certa dificuldade coletiva em perceber. O Porto do Itaqui está batendo recordes atrás de recordes – e hoje é o maior complexo portuário do Brasil em movimentação de cargas. Citaria, como exemplos, a exportação de grãos e a importação de combustíveis. De fato, nesses últimos meses, o escoamento de grãos do Arco Norte pelo Porto do Itaqui cresceu muito – o que acho muito natural, já que estamos mais perto dos mercados consumidores: EUA, China e Europa.

Especialistas estimam que a região de influência do Porto do Itaqui, chamada hinterlândia, do Porto do Itaqui, que hoje se estende até a fronteira entre Goiás e Mato Grosso do Sul, deverá alcançar a fronteira do Brasil com a Bolívia em 2025. Enquanto isso, a demanda por minério tem crescido extraordinariamente no planeta. Tanto a China quanto os Estados Unidos anunciaram programas, na casa dos trilhões de dólares, de investimentos em infraestrutura.

O Maranhão está, como disse, no centro dessa ebulição. Não é por acaso que dois novos portos têm previsão de se instalarem no Estado, quais sejam, o Terminal Portuário de Alcântara, pela GPM, e o Porto de São Luís, pela Cosan. O primeiro se localizará no continente e o segundo deverá servir para a exportação de minério de ferro – algo em reação à demanda de minério de ferro pelo mercado planetário que cresceu muito nos últimos dez anos, mas o Brasil se aproveitou pouco disso.

Outros países, como a Austrália, triplicaram sua produção nesse interim. Aqui, um parêntesis: como o Brasil renunciou a fazer novas refinarias, nossos portos estão fazendo esse papel: exportamos óleo cru do pré-sal e importamos derivados de petróleo. Os portos assumiram, portanto, o papel de “refinarias”. Ou seja, São Luís é claramente uma “cidade portuária”, mas ainda não se reconhece coletivamente como tal. E, conforme falei, a tendência é termos um “condomínio de portos” no Maranhão, que incluirá o “porto seco” em Imperatriz que, dada a importância da Ferrovia NorteSul, terá papel central na região.

A sociedade, em particular, as universidades, têm de atentar para essa situação.

JP – Quais os desafios e perspectivas para o Maranhão no setor ferroviário?

AK – As ferrovias estão vinculadas fortemente aos portos atuais e futuros do Maranhão. É interessante notar que, por conta de o Terminal Portuário de Alcântara ser no continente, foi assinado contrato de uma ferrovia que cruzará o Maranhão de Açailândia a Alcântara, com extensão de mais de 500 km.

Outra ferrovia importante para um setor estuante do Maranhão, centralizado na nossa querida Balsas, é o agronegócio – que se expandirá ao Norte do Maranhão nos próximos anos.

Claro que esses são todos investimentos grandes e claramente exigem planejamento de longo prazo. Por isso, é importante ficarmos atentos ao Projeto de Lei 261, o marco legal das ferrovias, que poderá dar um impulso muito grande no setor.

JP – Em relação ao Centro Espacial de Alcântara, houve avanços?

AK – Houve avanços. Foi aprovado o Acordo de Salvaguardas Tecnológicas, o que garante a preservação da propriedade intelectual dos dois países. Como consequência, três empresas americanas (Hyperion, Orion AST e Virgin Orbit) e uma canadense (C6 Launch) devem operar no Centro Espacial. É bom lembrar que a Coreia está em negociação.

Por outro lado, a Agência Espacial Brasileira, comandada pelo Coronel Moura, criou algo que é inovador, no sentido da inclusão e do diálogo com a sociedade maranhense – o que, em termos históricos, é uma novidade, que é o PDI-CEA, um plano de desenvolvimento do Centro Espacial e que inclui vários atores do Maranhão, liderados pela Fiema.

É importante lembrar também que, para esse fim, foi criado o curso de Engenharia Aeroespacial na UFMA assim como tivemos o primeiro mestrado em Engenharia Aeroespacial no Arco Norte, com a participação da UFMA, Uema, UFRN e UFPE.

JP – E a questão dos quilombolas, pode-se dizer que já houve uma solução adequada?

AK – No século 18, a então Vila de Santo Antônio de Alcântara tornou-se uma das principais áreas de prosperidade no mundo! Fez isso se aproveitando de um cenário externo favorável: por um lado, o iminente início da primeira revolução industrial e; por outro, pela chamada guerra da independência que opôs treze colônias americanas à Inglaterra. Quase 250 anos depois, vivemos um cenário similar. Outra revolução industrial e uma conjuntura internacional singular. Os esforços têm de incluir o povo de Alcântara, levando consigo educação, ciência e tecnologia – algo que o IFMA, UFMA e o Iema fizeram mas, principalmente, a posse da terra.

Sobre os maranhenses de Alcântara, tenho, como maranhense que também sou, conversado e trocado ideias. Houve o esforço do Governo Federal em distribuir os títulos – que foi um avanço. O Governo Estadual e a Fiema também têm feito grandes trabalhos em termos de integração da cidade histórica. Simbolicamente eu diria que, para a região que queremos a mais tecnologicamente avançada do Brasil, é estranho não ter internet em todo o seu território. Precisamos avançar.

JP – Por fim, o que está faltando para o Maranhão superar o atraso e a pobreza?

AK – Educação é o caminho. Ela desestabiliza a História dos países fomentando desenvolvimento! Claro que há um longo esforço à frente. Mas, embora haja sinais inquietantes no Brasil, neste meu breve período de vida de completa dedicação ao ensino e pesquisa, creio que tenham florescido vários frutos.

O Governo Flávio Dino fez um dos maiores investimentos em educação que se tem notícia. No Governo Lula, os IFMA e UFMA aumentaram extraordinariamente. Por exemplo, Imperatriz, minha cidade natal, tem quatro mestrados e um doutorado – a maioria implantada na nossa gestão como pró reitor. Os Sesi e Senai têm avançado, inclusive em Alcântara.

Por outro lado, não tem como oportunizar educação sem riqueza. Porque é largamente conhecido que há uma relação direta entre energia e PIB. Para isso, há um cenário extraordinário no momento: o Maranhão como eixo central do Arco Norte – temos de tentar espelhar nesta região o que acontece na margem leste, onde tem o pré-sal, as grandes refinarias, ferrovias, cabotagem e pujança econômica. E, com isso, consolidar o Maranhão como hub de logística do Brasil.

Enfim, a História demonstra que, para haver o desenvolvimento de um país de forma vigorosa, o conhecimento científico e a educação devem ser colocados no centro das questões nacionais e revalorizados como alavancas para o crescimento econômico, para a reindustrialização e a redução da pobreza, aliada a uma economia ambientalmente sustentável e solidária.

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